Clima




Liguei para Dona Rute hoje, minha vizinha. Mais de 60 anos e com uma saúde melhor que a minha, com 36. Liguei para falar sobre amenidades. Sim, sobre o clima. Por algum motivo besta eu e Dona Rute sempre falamos sobre a questão da saúde.

Eu me preocupando com ela, mesmo ela tendo a chamada 'saúde de bicho'. Depois de uns dias sem se falar no 'zap', e tendo passado pela UPA esses dias, e me assustado, decidi conferir a quantas andava a saúde da minha saudável vizinha. — Dona Rute, como é que a senhora está? Com essa mudança no clima, um monte de idoso e criança tá enchendo a UPA, né? Um monte de gente arriando doente com essas viroses. É o homem acabando com a natureza. É esse tempo ruim. Dona Rute é magrinha, franzina e ainda por cima mora sozinha.

Inspira cuidado. Pura besteira minha. Ela é realmente mais saudável que eu e você que está lendo agora. Você já passou por isso? Do nada você lembra de alguém que você não falava por algum motivo e daí você liga, deixa uma mensagem ou manda um 'zap' nem que seja para falar sobre... amenidades. Disseram que a gente iria ficar assim depois da pandemia, cuidando uns dos outros e importando-se mais com o mundo. Não sei se isto está mesmo acontecendo. De todo o modo, o clima é algo que deveria preocupar a todos nós.

Estava escrevendo meu terceiro livro em dezembro de 2019. Resolvi parar. Veio a quarentena, a pandemia.Não tinha 'clima'. Tu consegue lembrar? Parece que foi ontem que a gente recebia as notícias de todos os lugares: mais de mil pessoas morrendo por dias, muitas deles por falta de... ar. Não tinha clima. O capitalismo fazendo questão de destruir a natureza e ela, de alguma maneira, revidando. Alguns de nós perdemos tanta gente querida que é até aceitável um certo exagero no cuidado com os nossos. 2023 e vem uma nova onda de chuvas, climas terríveis, frentes frias e chuvas. No Rio Grande do Sul o povo morre vítima de um novo fenômeno climático.

O governador (com letra minúscula mesmo), curte um show bem distante, alheio a tudo. Parece o bolsonaro (outro que não merece se quer uma letra maiúscula para iniciar o nome, tão insignificante que é) que durante um desastre chuvoso na Bahia, em plena pandemia, resolveu passear férias no meio da semana, passeando de Jet ski. Desligo a TV e o celular. Quanta apatia e desumanidade nas bolhas ricas dos adoradores de um Jesus que não é o meu, que não sabe o nosso endereço nem frequenta os mesmos lugares que eu e você, ou Dona Rute, a vizinha sempre simpática que manda mensagem em plena segunda-feira perguntando "como a gente vai, como vai à família, como vai às meninas e como está o clima?". 

- Tá bebendo água? Fazendo exercício? Se alimentando bem? Olha esse clima, viu? E eu me perguntando, perguntando a Dona Rute e ao leitor que agora me acompanha: pra onde é que a gente vai?

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