Criar Pontes

 




O funcionário do postinho de saúde perto de minha casa já virou meu amigo. Chamo de postinho, assim no diminutivo, por intimidade e carinho. O rapaz do postinho é chamado de Mago. Eu não sei o nome dele, mas ele é magro. Então a gente chama ele de Mago. Muito educado, o Mago passa o dia trancado numa sala minúscula e dizendo ‘não' para todo mundo. Chegamos na portinha, chamamos o Mago, entregamos a receita e ele diz que ‘não tem o remédio desejado’.

Tem coisa que a gente não sabe. Coisa pequena. Coisa simples, não necessariamente as grandes perguntas e questões da humanidade,  tipo, quem veio primeiro: o ovo ou a galinha? Ou Deus realmente existe? A gente não tem resposta para perguntas simples como por que falta remédio no postinho?

Outro dia, depois de ouvir um não do mago uma senhora, frequentadora assídua e também colecionadora de nãos deu pistas para uma possível resposta sobre isso: não tem remédio no postinho pois é preciso manter o povo doente. Não fazem hospitais públicos pois hospitais não dão lucro. Imagine só: milhões para fazer um hospital.  Contratos, concursos. Inaugura-se a obra para... receber gente doente. E pobre. Isso não dá lucro. Se brincar, ganha nem voto

E as escolas? Fazer escola pra pobre? Educação é cara. E o filho do rico já tem onde estudar. O negócio mesmo é fazer praça,  colocar nome de parente nelas. Inaugurar ponte, construir estradas e viadutos. Isso sim. Ninguém vai reclamar. Se sim, não tem problema.  A maioria do povo tá com fome mesmo. Gente com fome não costuma reclamar. Não por muito tempo.

No fim das contas o estado é feito o mago. Tá ali, a gente não sabe quem é,  não conhece o nome dele e ouve sempre aquele não nosso de cada dia e segue. Mas ele faz com um sorriso,  com tanta educação que a gente pergunta já acostumado, já que pior que um não é um nada. 

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