Carrinho de compras...

 


Não me recordo de fazer compras com meus pais na minha infância. A lembrança simplesmente não vem. Hoje, não sei bem um motivo, é uma das coisas que eu mais gosto no “dever de casa”. Fazer compras, lavar pratos ligar o rádio. A lembrança que me vem quando falo em fazer compras é esperar meu pai no dia de feira. Cada um dos 3 filhos tinha seu dia de esperar o pai voltar com a feira. A gente ficava subindo no banquinho do muro, dando aquela espiada pra sair correndo com o carro de mão velho pra ajudar o coroa a trazer as sacolas com a logo do Hiper Bompreço. Também não lembro de mãe indo junto. Ela não curtia muito. Ou estava trabalhando ou preferia ficar cuidando da casa. 

Tinha um comercial de biscoito cantado por um desses caras aí de sucesso da música baiana que meu pai sempre trazia. “aveia e mel, que delícia”. Um amigo de nosso pai emprestava o cartão do mercado pra gente fazer a feira. Não fosse isso a gente ia passar um perrengue daqueles. A sensação de se sentir útil. Talvez isso foi uma marca dessa época. Uma vez eu me meti na maior encrenca com meu pai por causa de dois pacotes de preservativo. Eu não devia ter nem 12 anos (mas essa é uma história pra outra hora). Pegar a sacola, separar a comida por categoria, ajudar mãe, separar e guardar as sacolas. 

Na universidade, morando com outras pessoas estranhas, o ato de fazer compras era algo que nos aproximava. Eu fazia a listinha, pegava o dinheiro com os meninos e a gente ia junto pro mercado Fazer a feira da quinzena ou do mês. Na primeira semana morando sozinho, meu primeiro desafio: com uma nota de 100 pra comprar um par de pilhas para um controle remoto e eu sou inadvertidamente acusado de estar roubando comida naquele que era o maior mercado da cidade. Eu preto, todo de preto, com um black power daqueles. Foi racismo. 

Hoje, eu e minha filha comprando biscoito e Danone no mercado perto de casa. “É sua?” Essa pergunta anda quase comigo. Eu Fazendo feira em 3 locais diferentes para economizar um trocadinho. Pandemia. Crise. Menos sacolas por cada mês que passe e as sacolas vindo cada vez mais magras. Como é que se cobra R$10 em duzentas gramas de leite? As idas ao mercado agora são motivos pra briga dentro e fora de casa. Desespero. Azia. A fila do caixa fala mais sobre nossa realidade do que a gente poderia imaginar. E hoje, saída de mais um marcado caçado para uma tentativa de economia, uma mãe com seu filho pequeno pede na saída uma ajuda qualquer e a gente tem que parar, se olhar nos olhos e ver aquilo que podemos tirar pra não fazer falta num mês que já começa no sofrimento e já começa a passar apuros em  pleno dia 12 ou 15. 


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