Os Ricos não Dormem


   


   Os pobres que lutem. Eles que façam de um tudo para se salvar. A burguesia não precisa de luta. Ele já tem tudo. Um telefonema e brotam do chão os outdoors, panfletos e revistas, jornalistas em cada esquina, economistas, sociólogos, ideólogos, defensores de toda essa falsa disciplina. Os ricos não precisam de heróis. Eles criam os seus para nos entregar seu pão mofado de mentiras. Nas fábricas, contam-se as gotas de lágrimas que vertem e fogem. Dividem-se em dois, não mais que isso, esse contraste de realidade em pormenores.
   Aqui no brazil é assim: divide-se o salário para trinta dias (que mal dura quinze) e morre-se. Morre-se à míngua. Morre-se de assalto, de infarto, de bala perdida e até da chuva (quem diria?). Morre-se de pneumonia, de dor de dente, de picada de mosquito, de dor de barriga, depressão, câncer. Só não se morre de raiva nem de tédio ou de beijo. Sim, porque não se pode morrer de beijo? Há tanta coisa ruim acontecendo, porque não ver alguma coisa bonita, tipo um arco-íris depois de um dia de chuva?
   Nós, pobres, somos massacrados todo dia. Há uma máquina de moer gente em cada esquina, uma arma pronta a ser disparada (por acidente ou não) para separar vidas que não são suas, que não importam a quase ninguém. Só os ricos que não se abalam, eles que não sentem fome, não sabem nem como gastar as fatias das riquezas que nunca foram suas. São eles que têm medo de nós. Medo dos pobres. Medo daqueles que não dormem.
   Só os pobres que não dormem com medo. Medo da goteira, medo do ladrão (que também é pobre), medo de ir para o inferno e medo também do paraíso. Mas só os ricos que tem que tomar remédios para poder dormir, entorpecentes para sonhar, fazer caridades para convencer seus travesseiros. Os pobres que lutem. Os ricos, esses não precisam lutar. Não precisam nem de vida. Não precisam nem viver. Eles são zumbis.                                                     

Comentários