O Homem das Muitas Milhares de Palavras. . .

Arte do Quadrinista Adriano dos Anjos, autor de, entre outras obras, da HQ Cruz Credo. obs: sem data vênia.



O livreiro chega cedo. Com chuva ou com sol. Abre seu “fiteiro” improvisado, arruma uns livros novos que chegaram: Harry Potter, Crepúsculo, um Marx e um outro do Miró, toma um café na irmã Maria e segue. Hoje irá vender 16 livros, sete formatinhos da DC, tomar três xícaras de café bem forte, comer uma fatia de bolo e voltar pra casa feliz. Lá vem Marcelo com uma dúvida sobre o mundo. Juliana chega com a mãe para pegar os livros que tanto procuravam: “esses deram trabalho para acharem, demoraram pra chegar, mas irão pelo mesmo preço que pensaram”, não irá fazer uma desfeita dessas com uma cliente que lhe compra há mais de vinte anos.  O mesmo não vai acontecer com os dicionários de espanhol para aquele sujeito ali, professor, metido a dono do país. Nele vai aplicar. “ele num esbanja tanto ser o rei da cocada preta? Deixa pagar um pouco mais; também tenho minhas contas pra pagar”.
Livreiro chega cedo e arruma as pilhas de livros, caixas de quadrinhos. “se for montar um sebo, faça para todo mundo; não vá pensar que um sebo deve ser feito só para você ou para seus amigos”. “e daí se o livro é um Best-seller da moda ou um clássico do Machado de Assis? Livro não tem religião nem status quo; livro é feito pra se ler!”. Livreiro sabe das coisas e da vida. Livreiro vende mundos e poesias, enche as ruas de qualquer cidade de músicas e cores.
Já reparou que o nível da cidade é medida pelo número de sebos que ela possui? Uma cidade sem livreiro é uma cidade morta. Fazer as palavras circularem, encherem cabeças, passarem de mão e mão é missão dada pelos deuses. Dizem que o que mede o alcance de um bom livro, o teste definitivo, é encontrá-lo num sebo, preenchendo o chão, ali ao lado de Vinícius ou Drummond. Quer saber o TOP 10 dos livros mais vendidos? Pergunte a eles? Esqueça essa coisa de lista que sai nessas revistas “especializadas”. “é tudo mentira! Tudo comprado! É tudo Fake News!” pergunte ao livreiro. É ele a única pessoa capaz de enumerar os dez, vinte, trinta livros mais relevantes lançados para cá. Sacerdotes do conhecimento. Quer saber se um livro vai vingar? Espere o lançamento e volte lá depois de três meses. Ele vai te explicar. Quer uma dica de leitura, saber como passar naquele concurso, saber sobre as quinze mortes e as quinze quase mortes do Batman e do Super-Homem, senta na cadeira e presta atenção. Livreiro é senhor do tempo, dono da razão.
Livreiro vende futuros, é um gênio fora da lâmpada mágica. Livreiro sabe de tudo. E vai embora de um jeito tão veloz, tão estranho, tão inesperado que a gente quase se esquece que livreiro é um ser imortal mais vai pra casa de ônibus. Sabe sobre tudo mais não são lembrados pelos grandes quando se vão. Livreiro não tem nome. Não é ser daqui. Parte pra outro mundo numa nuvem. Deixa toda sua sabedoria em palavras e vai. A gente que fica aqui. Sem saber.

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