Ordem do Dia




    Dizem que choveu, naquela fatídica madrugada de 1º de abril de 1964. Reacionários, covardes, medrosos, indecisos, ludibriados, jovens. Soldados (armados ou não, amados ou não) com suas baionetas de mentira, suas fardas verdes de mentira, suas tintas de traição derretendo, escorrendo por seus rostos monstruosos, deturpando seus semblantes zumbis, sendo levados pelas aguaceiro que tomou conta da nação. Quem sabe não se viram o sangue também caindo como temporal, misturando-se ensurdecidamente como um rio de mentiras, como um verdadeiro pé-d'água por sobre corpos vazios, apodrecidos, insepultos, mortos. Vidas já sem vidas, verdadeiros vende pátrias, iscariotes de plantão. E a aguada caia, deslizando fria. Fria sobre peitos que não batiam, corações que não palpitavam, verdadeiros zumbis repetindo ordens, batendo continências, expelindo decretos por debaixo dos panos. Dizem que choveu no dia da mentira. A borrasca foi a única testemunha daquele dia de crime. Um ato covarde, quase tão covarde como a entrega do Cristo. A chuvada vindo e os americanos comandando o golpe. Palmo a palmo, gota a gota a bátega  dominava, enquanto o país dormia. Pancada a pancada, contada pelos olhos atentos da mãe liberdade, que golpearam. 



     Salseirada e poesia. 55 anos após aquele degradante dia e nosso país não afundou-se em silêncio. A garoa fina tomando conta do Recife, somando-se a outros córregos e rios, encontrando outras afluentes, outros braços país afora, destruindo o discursos dos falsos vencedores que não venceram nada, hipócritas, fascistas. O borriço se indo, virando quietude no fim da manhã e parentes, familiares, amigos de mortos (que estão mais vivos do que nunca) rememorando suas lembranças e seus imortais nomes. 
     Do outro lado, o silêncio enorme. O desprezo e o repúdio de uma nação inteira, obrigando os ratos clandestinos a se reterem ainda mais em seus porões. Discrição na Ordem do Dia. Comedimento e reticência no "rememorar a revolução" que nunca aconteceu. Sigilo e frouxidão sustentando o general mofino, fracalhão, timorato, pávido. O presidente, mentiroso de carteirinha, foge para o Muro das Lamentações. Vai fazer papel de Fariseu. Espantadiço, esconde-se nas teclas de seu Smartphone importado, doado pelos senhores das guerras, para atacar os filhos da liberdade. 




55 anos depois e o brazil lembra de seus mortos e os honra. 55 anos depois e as ruas, a chuva e o futuro exigem justiça. 55 anos e a polícia ainda tortura, some com corpos e pratica sandices que, (tempo vem) não ficarão impunes. A chuva caindo e há cruzes sendo colocadas para exigir. Há música para celebrar seus sacrifícios. Há flores. E a chuva ia caindo firme mas os braços dados não permitiam o frio ou a solidão. Éramos bem mais fortes ali, unidos, celebrando um certo amanhã. Nossos heróis, pais, irmãos e filhos. Todos com nome e mais vivos do que nunca. E do outro lado? 












 





*Esse texto é em homenagem as heroínas e heróis de nossa pátria, doadores de suas vidas em prol de um amanhã. Esses são eternos. Ate a vitória. Sempre. 

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