Reconstrução...



Comecei a estudar na UAST em 2008.2, em Agronomia. Na época ainda era o vestibular da COVEST, dois dias de prova, e o índice de reprovação nas provas para entrar na UAST eram imensos, reflexo da péssima qualidade do ensino público no brazil (assim mesmo). Ao entrar na UAST em Agosto daquele ano tive um susto: aqueles estudantes que escapavam do “funil” chamado vestibular enfrentavam outro, bem pior, chamado “vida acadêmica”. E o choque foi grande, direto, quase assustador: após passar uma semana procurando casa para alugar, chega o ônibus da ERIVANTUR, lotado, em pleno meio dia, para jogar um balde de água fria em meus sonhos. Como eu, que fui diretor do Grêmio de minha escola, que sempre defendi o direito dos estudantes poderia me comportar?
Na UAST não tinha DA, não se falava em DCE, e não se via nada relativo a qualquer tipo de organização por parte dos estudantes. A única coisa que se ouvia era “fale com fulano”, “procure beltrano”, “o responsável é cicrano”, e isso sem contar toda a burocracia, coisa que eu não estava acostumado, mesmo: CTA, CONSU, CCD, PROGEST, VA, DCE, documentos e mais documentos para imprimir, arrumar, autenticar e resolver. Claro que foi horrível. Tão horrível quanto ouvir na aula magna que “tínhamos que agradecer pela vaga, e que, se não quiséssemos nada com a vida, teria um monte de gente querendo entrar em nossa vaga!”. Apesar disso, juro que o discurso do ex-reitor da UFRPE me impressionou.
Na aula, os primeiros amigos, alguns presentes até hoje, outros que não tenho mais contato. Para quem não teve aulas regulares de matemática, química e física, além de só estudar o "Verb To Be" durante anos, encararem Química analítica e calculo era, sem dúvida, além de novo, assustador, sobretudo quando recebemos a notícia de que não teríamos professor de cálculo e que pagaríamos à cadeira durante as férias, antes do Carnaval, quatro dias e dois professores para ser mais exato. “matemática não se questiona, você aceita e pronto!” era o que dizia um dos professores, que passou um prova com consulta pra gente fazer. A outra professora foi mais sensata: passou um trabalho. Em quatro dias aprendemos derivada, limite e que pagar uma cadeira em quatro dias é um passaporte para reprovar em calculo dois, como ocorreu com 90% da turma no semestre seguinte.
Nessa altura é já era representante de turma, já estava tentando montar o DA de Agronomia e participando ativamente de todas as atividades que apareciam na UFRPE. Fomos pro FEST TRIATLON, montamos o projeto da Gincana na UAST como o serviço social, Natal Solidário e todas as semanas de curso, feira de profissão, EXPOSERRA e etc., etc., etc. acho que a necessidade da unidade fazia com que os estudantes, técnicos e professores fossem mais próximos, mais unidos. Hoje isso normalmente, tem acabado. Crescemos, expandimos. Mal dá pra diferenciar um professor novato ou um estudante calouro.
E a coisa era um tanto degradante: a estrada de barro, o “Poeirão” lotado, o medo de voltar pra casa e toda a dificuldade enfrentada pelos veteranos da UAST, passada pra nós, calouros. Duas coisas marcantes foram o “poeirão”, ônibus de viagem bem velho, desses da década de 70, que tinha inúmeros buracos no piso e uma cratera no lugar do banheiro. Imagine a cena: “com emoção ou sem emoção?” perguntava o motorista. “com emoção!” respondíamos. E tome carreira. E tome poeira, ao ponto de quem tivesse uma camisa branca chegar com ela de outra cor em casa. Parece coisa de filme? Imagine quando chovia, e os ônibus sem manutenção deslizavam na estrada e a gente quase colocava o coração pela boca. Inúmeros acidentes ocorriam. Inúmeros. A diretoria dizia não ver os carros lotados, a reitoria era coisa de outro mundo (“só na aula magna”, brincavam os veteranos, nos chamando pra assistir à próxima e constatar que o discurso seria o mesmo. Eu fui. A várias. Dito e feito). Outra coisa era o Forró do Matuto, nas quintas, com a banda Forró do Buzão. Aprendi a dançar/enganar Forró ali. Eram as noites de fuga, quando não sobrava uma VA no outro dia de manhã.
Com uma bolsa de R$70,00, um namoro acabado pelo orelhão (eu que comprei o cartão) e a vontade de voltar pra casa, decidir se era mesmo isso que se queria da vida e as apostilas para a segunda VA seguíamos todos. Lembro de ter chorado nas escadas do apartamento por “não sei por que” quando sai do banco e, ao chegar em casa, reparei que não tinha quase nenhum dinheiro em vista. Lembro de quando fui acusado de ladrão dentro de um mercado, que eu não ia só por ser negro. Lembro do professor que nos deu uma das maiores lições da vida (“não importa de onde você veio, e sim pra onde você quer chegar”) e dos amigos que fiz das manhãs acordadas cedo. Eu ia era a pé pra faculdade, voltava às vezes. Economizava na passagem (o dinheiro do pão) e ainda fazia exercício.
O maior sentimento que eu tinha não era o de orgulho por ser universitário, estar fazendo meu futuro, construindo uma carreira profissional de sucesso. Nada disso. Essa ilusão havia saído de mim, minha cabeça mudada, minha consciência cresceu junto com o meu cabelo, que eu havia raspado, seguindo o ritual aprendido em algum lugar dessa vida. Hoje ninguém faz mais isso né? Aí chegou outubro, eu estava quase decidido voltar pra casa em definitivo quando alguém chega na minha sala pra chamar os estudantes para participar da eleição do DCE, de um movimento chamado Resistência, que estava compondo uma chapa chamada Reconstrução. 5 e 6 de Novembro de 2008. Eu me lembro. Dois dias que fizeram a diferença em minha vida e mudaram totalmente minha visão

Comentários

  1. Ainda bem que estes dias aconteceram, ainda bem que você decidiu permanecer, e por isso os estudantes da UAST tiveram uma voz ativa! Um grande abraço cara! ;)

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  2. Ê muita luta, mais aos
    Poucos foi vencendo, tenho orgulho de voce meu filho voce meu filho clives te amo e sou sua admiradora.

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  3. Ê muita luta , mais aos poucos vai vencendo , ja é um vencedor, por tudo que passou te amo meu filho cloves.

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