Houve uma época, em meu bairro,que costumava faltar energia todo santo dia. Não faltava disposição para efetuar o pagamento por parte da comunidade, ainda assim a bendita costumava faltar. Isso era no início dos anos 90, quando começaram aquelas ondas de privatizar tudo. Pois bem. Arrumávamos as camas, tomávamos banho e o café. Seis horas em ponto, ia embora à eletricidade. A rua escura, o silêncio nas casas do bairro, as velas acesas e o puro esquecimento das autoridades. Pra mim e meus irmãos aquilo era lindo; crianças. Não dava pra imaginar coisas como violência, assaltos, arrombamentos e tantas outras coisas que a nossa mente de criança (culpa da Sessão da Tarde) não podia sonhar.
Na frente da casa a rua, os carros iluminados, os postes queimados e o sussurro daqueles que esperavam na esquina a luz, os outros, o assalto. Ano de eleição melhorava tudo. E enquanto isso não acontecia jogávamos, cantávamos nossas canções, ficávamos ouvindo meu pai e as suas histórias, até chegar à eletricidade de volta. Pensando bem, vejo que aquele tempo serviu pra muita coisa. Hoje eu imagino o quanto era bom desligar, diariamente, a televisão, e vivermos uma rotina familiar, caseira, só nossa. Algo verdadeiro, com luz. Um ritual de família.
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