A Revolta das Gravatas...





Chega uma hora que se ajoelhar e orar, ler a Bíblia e meditar, cansa. Sobretudo quando tratamos do termo juventude. Com o passar dos anos, a intolerância religiosa e certos costumes conservadores e arcaicos , foram dando lugar a novas interpretações e conceitos atuais, que, é claro, são fundamentais para garantir o futuro das religiões. Conservadores citariam passagens bíblicas que contribuem para a continuação de uma tradição. Trechos que falam abertamente sobre “continuar naquilo que se aprendeu, conservar uma “Sã” doutrina”e tantas outras. Isso até entendo. A Bíblia não é um livro científico. Na ciência tudo é debate, questionamento e transformação. Em religião tais conceitos não se aplicam. Apenas teoricamente.

O próprio Jesus deu grandes exemplos de subversão e modernidade ao falar com uma mulher Samaritana (coisa proibida por lei), ele quebrou tal paradigma, ainda mais quando reduz os Dez Mandamentos em apenas um ( ele veio cumprir a lei). Coisa que ainda se faz é negar o fato da Bíblia ter sido escrita há séculos passados, em contextos e situações históricas, sociais e políticas totalmente diferentes de nossos dias. E é engraçado, pois ao se falar de juventude e igreja a contradição chega a ser bizarra. Costumes medievais são mantidos, mas a Malhação progride a cada temporada que passa; temas como Sexualidade, drogas e tantos outros são postos de lado, mas a Internet é cada vez mais requisitada: “A cada Carnaval perdemos um número maior de jovens para o mundo”. Que alienação! Em que mundo nós vivemos? Ou melhor, não estamos no mundo? A questão é simples: não dá pra tapar o sol com a peneira e ir colocando uma pedra, toda vez que surgir nova interrogação. E é exatamente isso que a religião faz. Ela é responsável por colocar um “cabresto” geral e moral em nós (mas isso é discussão pra uma outra hora).

Lembro de um fato ocorrido em determinada igreja de Pernambuco, vivenciado por um amigo meu, cristão, membro da igreja e portador de certo senso crítico. No coral de jovens, um casal “cedeu aos desejos da carne”( coisa normal; se fosse do Diabo, Deus, o criador, não teria inventado), gerando um intenso debate entre os fiéis daquela localidade, sobretudo entre os jovens.O rapaz em questão foi rapidamente absolvido, enquanto que a jovem, passou a ser descriminada deliberadamente. Taxada de “impura”, a “ex-moça”(?) foi expulsa do convívio com os jovens daquela templo sagrado(!). Respaldo para tais atitudes? encontraram na Bíblia, aquele livro nada Machista, de capa preta e escrito, coincidentemente, por homens.

Tal situação trouxe à tona uma série de dificuldades, anseios e questionamentos, antes escondidos, e que a igreja fingia não notar. Como se não bastasse, o coral de jovens vivia em baixo de uma verdadeira ditadura de aparências e imagens distorcidas: não se podia opinar, chegar atrasado por motivo algum, vestir qualquer tipo de roupa que não fosse gravata, e tudo isso sobre a ameaça de expulsão do quadro de “jovens exemplares”. Como se não bastasse a pressão dos pais, o vestibular, a procura pelo primeiro emprego, a falta do primeiro emprego, o baixo salário do primeiro emprego, e o noivado, o casar, o bem-vestir, e toda sorte de regras que o “estar no mundo” nos obriga.

A situação naquele coral já não era a mesma, a interrogação por ter o rapaz sentado entre os outros, como se nada tivesse ocorrido, crescia como um balão inflado. A medida que se observava a jovem, ali, entre as mulheres casadas, sentada nos últimos bancos calada. Já não havia como silenciar. Nos dias que se seguiram diminuiu a frequência dos jovens naqueles respectivos cultos, onde se pregava mais a eloquência, a melhor roupa, o terno mais bonito e outras coisas. Porém, nada chamou mais atenção de todos do que uma atitude simples, silenciosa, mais envolvente desse meu amigo em questão: num agitado e esperado dia de Domingo, culto festivo, ele, que não costumava faltar as reuniões, apareceu justamente sem a sua gravata, contrariando as velhas normas estabelecidas, os costumes decadentes dos falsos irmãos. A interrogação agora passava a ser ainda mais latente: Que fazer? Todos questionavam tal atitude do rapaz; ele nunca tinha ido antes a igreja sem estar devidamente trajado de sua gravata. Mas a juventude presente sentiu, e sobretudo entendia oque se passava naquela congregação. Não demorou para, logo em seguida, todos os rapazes do coral deixarem de lado suas gravatas, criando um ambiente nunca antes visto e nem um pouco agradável aos olhos das autoridades eclesiásticas locais.

Não demorou para os jovens serem chamados a prestar esclarecimentos sobre tal atitude, sobretudo o iniciador do ato silencioso. Quanto ao posicionamento em relação a condição do julgamento e da decisão sobre a situação da “ex-moça”, nada ficou muito claro. Fizeram algo parecido ao encadeamento desse parágrafo. Fizeram como Jesus fez em relação a mulher que estava sendo apedrejada, ou, como no caso de Lázaro, amigo do mestre: tiraram a pedra e colocaram outra ainda maior; não mais a apedrejaram; em troca lhe deram as costas, deixaram-na só.

Aquele jovem sucumbiu ao mar das aparências que a igreja (instituição social?) representa, e se calou, pois a sua religião lhe ensinou a ser uma ovelha, não um questionador (prisão ideológica?). Ali, naquele coral juvenil todos deveriam e queriam serem vistos como exemplos; sem reclamar e usando suas gravatas. Uma falsa vitrine para se olhar máquinas frias, programadas apenas para repetir, responder, confessar; nunca questionar uma resposta. Aquele jovem foi taxado de “rebelde”, e isso, na igreja não era bom (E ainda não é)já que muitas denominações ainda impõem o cabresto da religiosidade em nossa juventude, se baseando em preceitos de fé, que como disse antes, são inquestionáveis. Interpretações que só cabem a uma minoria de iluminados para interpretar e manipular uma maioria de vidas sem o esclarecimento da verdade.

Penso no dia onde os jovens não serão mais engaiolados num livro cheio de valores hipócritas; um dia onde não ficaram “enclausurados nas paredes de uma religião”; o dia onde Deus não será só mais um personagem macabro, criado para nos adestrar; um dia onde seremos ouvidos, não pela roupa que vestimos ou pela gravata que usamos; um dia onde o SER valerá ainda mais que o TER e o PARECER, e as palavras não serão usadas apenas como meras repetições, mas andarão junto com a prática, pois sem isso são apenas letras mortas; um dia onde a juventude assumirá seu verdadeiro papel na sociedade e deixarão de se ajoelharem.Tomarão as ruas, deixando de viver uma vida de falsas aparências covardes e se lançarão em seu mais nobre dever: a construção de um novo amanhã, onde quem vale seja as atitudes e o dia a dia, não uma gravata bonita, um status instável, nem outra doutrina machista e covarde feita para entorpecer.

Um dia onde aquela música irá tocar bem mais alto: “Só porque Jesus sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer”.

Comentários

  1. Sábias palavras, meu filho! Parabéns pelo texto!

    http://multipersonalismo.blogspot.com/

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    1. Eu que agradeço...
      recordo das aulas que tive lá no "nosso" Lar, quando vc nos orientava e dava algumas preciosas dicas. Eu me achava um super-escritor, e vc, com toda calma dizia "é assim, faça assim, não é melhor desse jeito?"
      e hj eu posso ver meus textos, levantando temas tão importantes que precisam ser vistos, debatidos e entendidos por todos!

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  2. Deus abençoo sim, a relação entre homem e mulher mais depois de casados.
    E foi sim inspirada por Deus.
    Não foi homens que um belo dia decidiram escrever sobre algo q fantasiavam e pensavam n existir, pelo contrário esses homens foram encorajados por Deus para alertar pessoas, para dizer que existe um Deus maravilhoso, amoroso, que se preocupa com todos, independente de raça, religião e etc.
    Deus sabe o que é melhor para seus filhos e quem melhor poderia nos dizer o que fazer e como fazer do que o nosso criador?
    é claro que muitos sempre vão colocar impecilhos dizendo q Deus n existe, q isso é uma farsa, questionarão sim a bíblia, mais la é onde ouvimos o nosso Deus, é onde aprendemos um pouco mais dele...
    Pense nisso...
    Quanto mais Deus faz por nós, mais viramos as costas p Ele...
    Mais Ele continua de braços abertos e n faz distinção!

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    1. Eu esperava uma resposta ao texto, não uma repetição de dogmas e dogmas que vemos todos os dias. Que Deus é esse, o que exporta o Machismo, a Homofobia, a segregação? Um Deus que Sanguinário e dotado de hipocrisia, que está escrito em um livro velho que encobre e reveste as paredes de uma religião? Não. não é isso que espero. Espero a resposta para a fome na África, a resposta para as famílias que morrem de fome enquanto seus pastores constroem templos e mais templos, espero a resposta para todas as dores, que, me parece, Deus não anda vendo...

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  3. Parabenizo-te pela coragem e ousadia de falar sobre algo tão polêmico, por argumentar, enfim, por ter escrito, porém (quando aparece uma dessas conjunções o coração dispara e usarei algumas) acho que você não observou o outro lado. Explico, antes farei alguns comentários.
    Concordo: "Chega uma hora que se ajoelhar e orar, ler a Bíblia e meditar, cansa". Sabe por que cansa? Porque não adianta nada você pedir a Deus pra ganhar na loteria e não comprar o bilhete! Cansa, porque a juventude não se satisfaz só com isso. Ela quer ir além, quer louvar a Deus com rock, com rap, de calça ou de saia, com maquiagem ou sem, da forma como se sentir melhor, não quer ser obrigada a nada, quer viver... Pra isso é necessário abrir a mente! Questionar, debater e transformar, como você disse (e isso é possível, é possível colocar em prática as escrituras...).
    Há muitas "crenças" nas religiões, porque as pessoas não refletem, não veem que religião não leva a lugar nenhum. Sua função é organizar a sociedade, não maltratá-la como acontece. O evangelho é composto de exemplos de vida, assim como Chê Guevara lutou e é exemplo, há os que lutaram de forma diferente, é claro, mas que desempenham o mesmo papel. O que se vê muito são falsas doutrinas, costumes que sufocam e nada de atitude. A Bíblia é um livro histórico (e considerado sagrado--outra discussão) que adverte várias vezes "busque conhecimento, analise tudo, retenha o que for bom etc.", porém muitos não assimilam isso e acabam denigrindo a imagem de quem crê e segue o evangelho com e por besteiras. A Bíblia não é um livro científico, mas não contraria a ciência, creio que elas se complementam.
    Que bom que você crê na Bíblia (você fala que ela foi "escrita há séculos passados, em contextos e situações históricas, sociais e políticas totalmente diferentes de nossos dias")... é verdade, e isso é impressionante, pois mesmo assim, ela se aplica a vida atual. É obvio que para tal é necessário conhecimento e bom senso. Não posso generalizar uma passagem em que Paulo fala pras mulheres de Corinto não cortarem o cabelo, por exemplo, e exigir isso atualmente (apesar de algumas seguirem essa doutrina), deve-se analisar o contexto. Por que ele escreveu? Pra quem escreveu? Pra resumir, ele exortou nesse aspecto porque eram as prostitutas quem cortavam o cabelo na época...
    "Temas como Sexualidade, drogas e tantos outros são postos de lado", muitos consideram isso pecado!!! Volto a dizer, falta de conhecimento e até mesmo de leitura Bíblica (pois ela adverte "o mundo erra por não conhecer as escrituras"), ela está cheia de temas polêmicos como esses... Falta apenas alguns terem coragem para abordá-los e pararem de criticar os que já o fazem. A religião cega, sim, seguir bons exemplos não.
    O caso do seu colega é comum, infelizmente, por causa do que já foi dito e porque "os líderes" não tomaram Jesus como exemplo. Todos merecem uma segunda, terceira... ‘chances’ (Jesus falou certa vez "não devemos perdoar 7 ou 70 vezes, mas 70 x 7 por dia"). A questão da gravata é um exemplo de bom entendimento (por parte do seu colega), de uma revolta que faz sentido. O que Deus tem com as minhas roupas? Com a minha aparência? Será que Ele não me ouvi se eu tiver uma tatuagem? Isso não passa de crendice, Pai que é pai, ouvi o seu filho a qualquer momento...
    "Bíblia, aquele livro nada Machista, de capa preta e escrito, coincidentemente, por homens" é fato. Entretanto, se observamos o contexto, tudo resolvido. Você dar um ar sombrio a Bíblia, ela foi escrita por homens e para homens, todavia há traduções atuais que esclarecem esses aspectos, até a capa deixou de ser preta...

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  4. CONTINUAÇÃO
    Todo o seu texto, todos os seus ‘sonhos’ podem ser realizados, quando todos abrirem a mente, analisarem a situação e acima de tudo “amar o próximo como a si mesmo” ou em outras palavras “desenvolver ao máximo a sensibilidade até se sentir angustiado quando se assassina um homem em qualquer lugar do mundo” (Chê) e complemento ainda: fazer algo para evitar essas mortes.
    Excelente conclusão, exceto a parte “livro cheio de valores hipócritas”, assim você contraria os que nela acreditam contribuindo para um pré-conceito. Conheça-a, interprete-a, lendo-a como se fosse 'um lançamento' e perceba que ela fala de hipocrisia, mas não é uma.
    “Só porque Jesus sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer”. Quem disse que temos que sofrer? Ele já sofreu por nós, para nos ensinar. Creio que se realmente seguimos os seus passos, vivemos bem melhor, evitando vários sofrimentos. Retomo o que disse no início "você não observou o outro lado", falo isso porque você acaba generalizando (gostaria que fosse sem querer), pense que há pessoas (pessoas, não religião--esta serve só para organizar, unir pessoas que têm o mesmo ideal) que lutam para mudar esses pensamentos ultrapassados, que veem Deus de outra maneira, que lutam pela igualdade, que dão o seu melhor pelo outro, que não se conformam com a fome etc., pense também que infelizmente junto desses há os que não conhecem e distorcem e enganam.
    Parabéns mais uma vez, reveja alguns conceitos e obrigada também por ler o meu texto.

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    1. Gostei muito dos seus argumentos. Quando escrevi esse texto (99,2001, nem me lembro mais) o fim na intenção de gerar um debate, "tocar na ferida", ir mais fundo. E é bom saber q isso tem dado certo! A sua análise foi muito bem elaborada e criteriosa; me incentiva a escrever ainda mais. Dizem que religião, futebol e política não se discutem. E isso é um erro! São exatamente as exposições de opiniões e determinados temas q não nos deixam no escuro, e nisso vc acertou em fazer um debate coerente e muito seguro, sem olhar para suas concepções e convicções, partindo exatamente do texto!

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  5. Toda problemática exposta é fruto de tres coisas: vaidade, orgulho e egoísmo. Varridas do mundo, o mal não encontraria moarada. A subversão do Cristo tinha como objetivo deixar essa lição. Mas não devemos buscar isso em templos suntuosos, o templo é o corpo material (morada do espírito).

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